Luar, Amar
Dois estranhos na hora certa, no lugar certo.
Ele chegou quase de nada, caminhando lentamente, sem rumo definido.
Ela, perdida em pensamentos, aproximou-se da casa, misto de curiosa e contemplativa.
Eles trocaram longos e silenciosos olhares, deram-se as mãos e amaram-se na casa. E, depois de se amarem, sentaram-se na varanda a contemplar o mar, tal como se fossem dois velhos conhecidos. Foi somente aí que as palavras vieram. Junto com elas, os risos dos momentos um pouco infantis que criaram e que estavam vivendo.
E, então, partiram, cada um na sua própria direção.
Sem aviso, sem qualquer combinação, eles voltaram. Trocaram carinhos e trocaram idéias. Tal como antes, partiram, desta vez imaginando voltar novamente.
E voltaram. Muitas vezes. Não era necessário dizer nada, nem trocar mensagens; eles sabiam que tinham que voltar. Às vezes, ele não vinha ou ela não vinha. Não importava e não se cobravam pela falta. É preciso reconhecer que talvez uma lágrima furtiva caísse aqui e ali, como que dizendo:
– Senti tanta saudades de ti!
Mas, era só isso porque o importante era o estarem juntos.
Quando a Lua cheia surgia das águas, eles ficavam horas em silêncio apenas sorvendo cada minuto que passava, sem remorsos e sem a ânsia de que aquilo pudesse terminar.
Não seria necessário um observador atento para facilmente dizer que ali o Amor pulsava de um para o outro, que eles se completavam e que eles poderiam sentir esse mesmo Amor 24 horas por dia. Sim, eles sentiam o Amor; eles sentiam uma energia não mensurável fluir, dando a eles a vontade de continuar vivendo e de se encontrar sempre. Porém, eles também sentiam, sem dizer nada, que a rotina poderia retirar o prazer de estarem juntos, forçar a repetição das palavras, consumir o êxtase do amar, cansar o ato de estarem com as mãos entrelaçadas e de embotar a imagem dos olhares diretos. Por isso, eles apenas se encontravam.
O Tempo, marchador implacável, encarregou-se de fazer as tábuas da casa rangerem, de patinar a bela tinta das paredes e de desalinhar suas juntas.
O Tempo, marchando para todos, encarregou-se de transformar suas peles, antes lisas, em elaboradas; seus cabelos, agora, já eram o próprio brilho da Lua.
O Tempo poderia até ter deixado suas palavras mais pensadas, suas mentes mais maduras e os movimentos mais lentos; mas o Tempo não mudou o brilho do luar e nem as horas de contemplação e silêncio. Aquele mesmo observador poderia até dizer que o Amor entre eles teria ficado mais puro e mais doce ainda!
Mas, o Tempo, irredutível em seu caminhar, juntamente com a inexorável cadência da Lua subindo das águas, não a encontraram na casa naquela noite. Ele não ficou triste porque sabia que ela viria um dia; sentiu apenas resignou-se por não aproveitarem mais alguns belos momentos juntos.
Nem ela estava lá no próximo luar e nem no outro. Na verdade, nunca mais veio.
Ele, sim, vinha, sentava-se na varanda a contemplar o horizonte, deixava derramar uma lágrima ao sentir que não poderia materializá-la ao seu lado (que sabe ela não estaria com ele?) e ia embora.
Tempos depois, a varanda passou a ficar só. A Lua nascia mas não havia ninguém para observá-la. A casa ficou lá, sozinha, aos poucos perdendo sua estrutura.
O observador me disse, um dia – e ele jurou de pés juntos ser verdade – que, nas noites de luar, poder-se-ia ver duas silhuetas discretamente luminosas sentadas na varanda, quietas, juntas, abraçadas, a observar o movimento da Lua a riscar o céu. Assim que ela desaparecesse na borda do telhado e que o seu prateado se transformasse em sombras, as silhuetas levantar-se-iam e partiriam, cada uma para seu lado…
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