
Geometria Para Iniciantes
Todas linhas, teoricamente paralelas, convergem para um ponto focal fora da imagem.
– Estas são as formas geométricas mais simples – dizia minha professora de Geometria na escola quando eu tive meu primeiro contato com a matéria. Ela falava de pontos, linhas, retângulos, triângulos e círculos. Embora simples, eu perdia (ou investia?) longas horas estudando suas fórmulas para determinar comprimentos, áreas e volumes (eu me queixava naquela época mas nem adivinhava o que viria pela frente anos depois com fractais, equações diferenciais, integrais e laplacianos…).
Não me lembro mais do seu nome e nem do seu rosto mas, hoje, entendo que ela era o protótipo da professora formal seguindo todas as cartilhas da escola embora, em seu comportamento rígido, ela também era inquisitiva e tentava passar a consciência do ambiente que nos cercava e das coisas mais importantes da vida.
Um dia, quase no final da aula, a título de encerramento, ela falou de pontos. Sim, pontos, a forma geométrica mais simples. Ela não falava precisamente de pontos; ela também nos perguntou o que era um ponto. Nós nos olhamos confusos porque ela nos havia ensinado que um ponto geométrico não teria uma definição precisa e não poderia ser definido por outros meios. Este conceito também estava nos livros didáticos.
Usando de um pouco ironia e uma risadinha discreta, ela fazia questão de dizer que um ponto gramatical (aquele pontinho no final das frases) não tinha nada a ver com um ponto geométrico. E explicava:
– Em tese, qualquer forma geométrica (uma linha, por exemplo) poderia ser formada por uma sucessão de pontos, tão próximos uns dos outros que pareceria não haver qualquer transição visível entre um ponto e o seguinte. Já na Gramática, no máximo três pontos formam as reticências que deixam entrever algo no ar, sem conclusão.
Interrogativamente, encerrava o assunto:
– Sendo assim, é possível criar um ponto… a partir de um ponto?
Confesso que aquele assunto me deixou inquieto porque não tinha base para julgamentos na época. A confusão aumentou mais ainda porque na aula seguinte ela nos entregou uma folha de papel bem fino, pediu que fizéssemos o menor ponto possível com um lápis e a devolvêssemos. Ela olhou cada folha, selecionou três, recortou-as de modo a que coubessem juntas no retroprojetor e falou:
– Vocês estão vendo estes pontos? Este é bem pequeno; este outro é grosso e o último praticamente não se vê. Todos são pontos muito embora sejam tão diferentes entre si. Não se deixem enganar pelas aparências. Existem diferentes cores de peles, religiões distintas e diferentes opiniões, mas todos nós somos a mesma coisa: seres humanos que merecem nosso espaço e nossos direitos!
É provável que hoje estas palavras soassem de forma controversa pelos tempos de confrontação que vivemos mas, naquele momento, pareceu-nos sensatas.
Como a recuperar-se de uma divagação filosófica estranha àquela aula, ela mostrou fotos bastante ampliadas num microscópio de pontos feitos com lápis. Todas mostravam apenas uma pequena montanha de grafite em diversos formatos.
– A pergunta que fiz continua sem resposta – disse ela. O que é um ponto? No papel que vocês me apresentaram, um ponto parecia ser um ponto; mas, ao microscópio, um ponto é um grotesco amontoado de carvão. Onde está o ponto? Está no conceito da figura geométrica, é apenas uma representação simbólica. Para todos os efeitos, os pontos que vocês fizeram, são pontos e isto é o que importa. Aprendam a separar o real do imaginário; ambos são importantes mas cada qual a seu momento e a seu lugar. É muito bom imaginar para sonhar novos desafios e novas coisas; mas, não podemos nos esquecer de que continuamos pisando em solo firme e vivendo uma vida concreta. Saber equilibrar ambos é uma arte que leva à felicidade!
Como a dar o toque final de mestre naquelas palavras, o sinal de término da aula soou e, imediatamente, a grande maioria dos colegas saíram correndo, rindo e falando alto qualquer coisa. Alguns poucos, como eu, ficamos sentados, meditando um pouco nas palavras que me calaram fundo até hoje.
Ainda pensando naquela aula, eu associei a Geometria e suas formas básicas à Fotografia. Tal como aqueles pontos no papel, as fotos a seguir foram arranjadas dentro de um mesmo tema, muito embora, gostaria de enfatizar, sejam diferentes entre si, sem precisar voltar à escola!




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